Protestos nacionalistas: uma ameaça ao regime chinês?
24/02/12 12:15Por Eric Vanden Bussche, de Wuhan*
Num sábado ensolarado em maio de 1999, espalhou-se rapidamente pelas universidades em Pequim a notícia de que as forças da OTAN, lideradas pelos EUA, haviam bombardeado a embaixada da China em Belgrado, na Iugoslávia, resultando na morte de três jornalistas chineses.
Não demorou muito para que milhares de estudantes universitários se concentrassem em frente à embaixada dos EUA, gritando slogans anti-imperialistas e atirando pedras e garrafas de tinta contra a fachada do prédio.
Protestos também eclodiram em diversas cidades chinesas naquele fim desemana, incluindo Chengdu, no sudoeste dopaís, onde estudantes chegaram a incendiar a residência do cônsul dos EUA.
O resto do mundo assistia com preocupação o desenrolar dos acontecimentos. Vários especialistas no Ocidente chegaram a expressar o seu temor de uma China nacionalista e acusaram o Partido Comunista Chinês (PCC) de orquestrar os protestos.
Essa visão, um tanto quanto simplista, ignorava as tensões entre o governo e os manifestantes.
Na verdade, os dirigentes chineses estavam extremamente apreensivos. Embora os manifestantes dirigissem a sua fúria contra os EUA, eles também cobravam maior agressividade do governo na condução de sua política externa. Entre os membros da alta cúpula do PCC havia um receio de que os manifestantes poderiam expressar o seu descontentamento com o regime e, desta forma, transformar os protestos em uma ameaça a sua sobrevivência.
Os protestos nacionalistas daquele ano inauguraram um novo período de engajamento político de uma parcela da população chinesa, em sua maioria jovens universitários e acadêmicos. Muitos com os quais conversei enxergavam as manifestações como a única forma eficaz de influenciar a condução da politíca externa chinesa. A maioria acreditava que a passividade do regime em relação aos EUA e o Japão não refletia o status de seu país como potência.
Desde então, tais manifestações ganharam força, causando dores de cabeça ao PCC.
Em 2005, protestos antijaponeses se espalharam pelo país após o governo japonês adotar um livro didático que ignorava as atrocidades cometidas pelas suas tropas durante a Segunda Guerra Mundial. Na China, onde a retórica nacionalista difundida pelo governo mantém abertas as feridas causadas pela ocupação japonesa, essa decisão despertou um sentimento de indignação.
Enquanto as passeatas de 1999 duraram apenas alguns dias e estiveram confinadas às representações diplomáticas dos EUA, as antijaponesas de 2005 se estenderam durante mais de um mês e tinham como alvo não apenas representações diplomáticas mas também empresas japonesas e seus parceiros chineses.
Os atos de vandalismo contra esses estabelecimentos comerciais e a ameaça de boicote a produtos japoneses causaram preocupação entre autoridades políticas e economistas. Mesmo assim, a presença policial durante as passeatas não foi capaz _ou simplemente não quis_ evitar que tais atos ocorressem. Em alguns casos, policiais ficaram observando à distância os manifestantes estilhaçarem vitrines de lojas japonesas com pedras, se recusando a intervir.
A atitude da polícia nessa ocasião reflete a dificuldade do governo em articular uma posição coerente em relação a esses protestos.
A proliferação de mídias sociais ampliou esse desafio. Além das passeatas, microblogs se tornaram uma arma poderosa para a expressão de opiniões de caráter nacionalista. Nessa semana, os chineses saturaram os microblogs com críticas pesadas ao prefeito da cidade de japonesa Nagóia, Takashi Kawamura, por ter negado a ocorrência de atrocidades cometidas pelas tropas japonesas no massacre de Nanquim, durante a Segunda Guerra. Muitos exigiam a suspensão imediata das relações com o Japão.
Avesso a qualquer tipo de manifestação espontânea, o regime chinês ainda está aprendendo a lidar com a dinâmica própria dos protestos nacionalistas, seja em passeatas ou nos microblogs. Não se trata apenas de uma parcela da população que defende uma atitude mais agressiva do governo na esfera internacional. O principal desafio consiste em dar voz a grupos sociais que desejam participar do processo político, influenciando-o.
Eric Vanden Bussche é especialista em China moderna e contemporânea da Universidade Stanford (EUA). Possui mais de uma década de experiência na China. Foi professor visitante de relações Brasil-China na Universidade de Pequim e pesquisador do Instituto de História Moderna da Academia Sinica, em Taiwan. Suas áreas de pesquisa incluem nacionalismo, questões étnicas e delimitação de fronteiras da China.
*A partir desta sexta-feira, Eric Vanden Bussche passa escrever semanalmente para o blog.
O endurecimento político interno na China é atribuído por jornalista econômico norte-americano do jornal Asian Times (onde está, agora, o jornalista brasileiro Pepe Escobar), à classe rica ascendente, que deseja estabilizar a atual estrutura de poder. Para ele, os militares não influenciam o governo, como na Coreia do Norte. A nova situação mundial, depois da crise econômica de 2008, ainda não resolvida, agravada pela crise europeia, está ainda indefinida, mas acredito na força da população chinesa (que até o poder central tem respeitado). O século 21 está prometendo surpresas ainda indefinidas e que levarão tempo para mostrar sua face, porque guerra, agora, seria uma experiência ainda nunca vista em matéria de destruição. O cenário mais promissor é a China perceber que não pode se isolar do mundo e vencer suas desconfianças. Se adotar uma atitude positiva de colaboração, será força nova em substituição ao desmoralizado imperialismo norte-americano. Se quiser tornar-se hegemônica no mundo, teremos problemas de intensidade também nunca vista até agora.
Querem protestar contra o governo japonês por ele ignorar as atrocidades cometidas contra o povo chinês, mas esses manifestantes nem devem saber que o próprio governo chinês esconde da população as atrocidades cometidas e que ainda comete contra seu próprio povo…
Exatamente William. Essas manifestacoes anti Japao sao alimentadas pelo proprio regime. Ora, quem mora na China ve toda hora na TV filmes de guerra onde eles “vencem” o Japao…
E quem controla a TV? O proprio Partido…
O maior risco para o partido eh a estagnacao economica, e nao um bando de nerds nacionalistas.