China: o curtíssimo prazo
12/03/12 09:28Por Marcos Caramuru de Paiva, de Xangai
Os economistas brasileiros buscam permanentemente avaliar qual será a taxa de crescimento da China. A resposta para 2012 foi dada na semana passada pelo primeiro-ministro Wen Jiabao: 7,5%, ou seja, mais do que a média prevista no plano quinquenal, 7%, menos do que o governo da China tem declarado ser a taxa mínima para manter a estabilidade do trabalho e a oferta de emprego para os jovens: 8%.
A julgar pelo desempenho de anos anteriores, o resultado ao final de 2012 possivelmente será maior. O governo já declarou os instrumentos de que se vai valer para chegar lá: ampliar o crédito; reduzir os juros; se necessário, voltar a estimular o investimento em infraestrutura (mesmo reconhecendo seu impacto negativo sobre a carteira dos bancos) e, também se necessário, aliviar as restrições à compra de imóveis. A taxa de crescimento, anunciada como uma meta e não como uma expectativa ou previsão, é, sobretudo, uma referência. Vai balizar o desempenho esperado das municipalidades. A China tem discutido propostas para passar das metas nominais a novos critérios que levem em conta a qualidade do crescimento, sem resultado visível até o momento. Metas qualitativas são difíceis de definir. Além disso, elas eliminariam o espírito de competição por resultado entre as prefeituras, uma das forças estimuladoras das mudanças no país.
O efeito das duas reduções recentes no requerimento de depósitos dos bancos junto ao banco central _uma em dezembro passado, outra no corrente mês de fevereiro_ ainda não se fez sentir. A economia está sob o tranco das medidas de contenção do crédito de 2011. A boa notícia é que a inflação também.
Talvez o setor mais afetado em 2011 tenha sido o da construção. As empresas nesse segmento usualmente captam no curto prazo para projetos de longo, na expectativa de que, a cada 12 meses, lhes chegue a cartinha do banco anunciando a renovação de seu empréstimo. No ano passado, muitas cartinhas não chegaram. Como resultado, projetos foram interrompidos, fornecedores deixaram de receber pagamentos. Em outras palavras, para o setor da construção, o “hard landing” (pouso forçado) já é uma realidade. A liberação do crédito é boa notícia, mas o setor sabe que os primeiros beneficiários são usualmente as empresas estatais. Há tempo de espera pela frente.
O setor exportador tem sofrido o impacto da redução de crescimento nos mercados europeu e norte-americano. As exportações chinesas cresceram 28% na metade do ano passado e 12% em dezembro. Queda sensível. Os números recentemente anunciados, de que o crescimento do comércio exterior ampliou-se apenas 7% nos dois primeiros meses de 2012, prenunciam que as exportações não tenderão ao brilho. O que se ouve frequentemente é que muitas empresas estão operando no vermelho para não parar as máquinas, exportando a preços inferiores ao custo de produção. Se isso for um fato, é de esperar que os processos antidumping contra produtos chineses ampliem-se no mundo inteiro.
Os investimentos no setor industrial são , em larga medida, norteados pelas diretrizes governamentais. Os empresários ficam esperando os sinais de Pequim. Neste momento, quem opera em tecnologia de ponta sabe que os ventos lhe sopram a favor. Os demais não estão tão seguros. E como 2012 é um ano de transformações no mundo político, talvez os sinais de Pequim não sejam tão claros. Com isso, o desempenho do investimento resulte fraco.
Em resumo, ainda há pouca sintonia entre as metas projetadas e o que se vê na realidade do dia a dia. Mas os próximos meses deverão conduzir a um melhor ponto de equilíbrio.
Já que o tema é o curto prazo, impossível não falar das expectativas sobre uma maior abertura da conta de capital. O anúncio recente de que fundos de investimento estrangeiro podem entrar na China não somente para investir no mercado local mas também para, a partir da China, investir no exterior não pode passar desapercebido por quem regularmente segue a economia. Não só é um grande avanço como deverá estimular os fundos chineses a moverem-se mais. Os 16 fundos com certificados QDII (investidores chineses certificados pelo governo para atuar em bolsas ou em renda fixa no exterior), as seguradoras e os bancos locais são tímidos nas suas estratégias externas. Mas este é assunto para um futuro artigo.
Algumas semanas antes do anuncio oficial da reducao da taxa de crescimento, medidas importantes foram tomadas no setor industrial. Nao foi divulgado abertamente e nem eh oficial: as estatais manufatureiras deixaram de ter como meta o volume de producao, e agora terao que andar com as proprias pernas, gerando lucro. Acredito que por pressao do setor privado, que sofria um certo dumping das estatais. No curto prazo estas estatais estao demitindo, se reorganizando e tentando reajustar precos, o que pode gerar certa inflacao em alguns itens especificos.
Acho mais importante ainda, a questao da abertura da conta de investimento. Como sera regulada? Sera que existe limite? Saida de RMB ao exterior seria uma ajuda na guerra cambial, valorizando o dolar internamente…e para onde iria esse fluxo de dinheiro? Acredito que para paises que pagam bem, como o Brasil e Turquia…nesse caso entrando dolares no Brasil, pressionando ainda mais o real no sentido da valorizacao. Na teoria, acredito que pode acontecer isso…vamos ver qual a forca e o volume do movimento.
Marcos, ótimo artigo e temática: o curto prazo chinês. Como sugestão de tema para um dos seus próximos artigos gostaria de ouví-lo sobre as perspectivas e os rebatimentos possíveis da troca de comando na China.
Forte Abraço, PS.
o desenvolvimento da china esta muito espantoso e muito bom apesar do regime do governo ser um regime comunista e ditatorial ,mas uma coisa que eu nao entendo como vai o pessoal da lavoura ,os das camadas bem baixa e seus direitos na parte de previdencia ,saude,aposentadoria,moradia e era isto que eu gostaria de endender como funciona isto na china
Eu discordo do termo ditadura, em comparacao com nosso governo, considero o deles bem mais “governo” que os nossos !
Caros, Marcos Paiva e José Martins
Estou acompanhando os seus artigos e mesmo tendo diferenças em relação as caracterizações sobre porque do crescimento chinês desses últimos 40 anos, quero dar parabéns pela iniciativa de vocês e da Folha, em elaborar sofre esse império que é a China.
Para mim, o determinante para o desenvolvimento chinês é o planejamento do Estado. A anarquia de mercado só beneficia alguns poucos, sem compromisso com o conjunto da sociedade e com o esgotamento da natureza. O pequeno giro que a era Lula/Dilma deu, no sentido de um Estado mais compromissado com o conjunto dos rumos da sociedade brasileira, mostra que o planejamento é fundamental. Lamentavelmente o Estado brasileiro, com suas instituições continuam reféns dos ventos anárquicos da especulação de “mercados”-
Excelente análise e muito pertinente. Os tempos da “China barata” parecem estar ficando para atrás com o crescimento dos sálarios, outros custos internos e o ajuste do câmbio. Estive na China três semanas atrás e voltei com a sensação que a China está redirecionando sua economia para o mercado interno! Para variar, numa velocidade espantosa. Isso vai ajudar a reequilibrar o fluxo de mercadoria pelo mundo e no ajuste do fluxo cambial. Os mexicanos já voltaram a exportar mais para os Estados Unidos e estão vencendo a concorrência chinesa em muitas áreas.