Sushi no Ano-Novo chinês
04/05/12 17:06Eric Vanden Bussche, de Taipé (Taiwan)
No ano passado, fui convidado para comemorar o Ano-Novo chinês na casa de Chang Yung-lin, um ex-militar de Exército taiwanês. Durante o jantar, fiquei surpreso ao ser oferecido sushi. Na China continental, oferecer um prato tipicamente japonês durante a mais importante festividade do ano certamente seria visto como um ato de traição, pois a memória das atrocidades japonesas durante a Segunda Guerra Mundial continua fresca na cabeça dos chineses.
Mas em Taiwan os japoneses são vistos com outros olhos. “Nós, taiwaneses, temos uma relação mais amigável com o Japão do que a China,” me explicou o ex-militar, filiado ao Partido Nacionalista (Guomindang, ou GMD), do atual presidente, Ma Ying-jeou. “Os japoneses ocuparam Taiwan de 1895 a 1945, mas desenvolveram a ilha, permitindo o nosso crescimento econômico no pós-guerra. Não podemos ignorar a influência do Japão na nossa sociedade e cultura.”
A visão de Chang Yung-lin sobre a herança da colonização japonesa se insere num debate mais amplo sobre a identidade de Taiwan que provavelmente continuará a azedar as suas relações com a China continental.
Desde os anos 90, está em curso um processo que visa forjar uma identidade étnica e nacional própria em Taiwan. Pesquisas de opinião pública realizadas nas últimas duas décadas mostram que uma parcela crescente da população da ilha não se enxerga mais como chinesa. Essa tendência pode ser observada tanto entre os taiwaneses que advogam a independência da ilha quanto aqueles que desejam estreitar os laços políticos e econômicos com a China continental.
Isso não quer dizer que os taiwaneses estejam renegando a sua herança político-cultural chinesa. Sun Yat-sen, um dos líderes da revolução de 1911 que derrubou a dinastia Qing, ainda é visto como o “pai da nação”, o mandarim é a língua oficial, as tradições culturais chineses são celebradas, e Taiwan se chama “República da China”. Entretanto os taiwaneses passaram a reconhecer também como parte de sua identidade as raízes aborígenes e as influências da colonização japonesa na formação social da ilha.
Como bem nos lembra a antropóloga norte-americana Melissa Brown em seu livro “Is Taiwan Chinese?” (Taiwan é chinês?), os alicerces da identidade de um grupo étnico ou nação são construídos a partir de experiências sociais comuns, que incluem experiências políticas e econômicas.
Se observarmos a história de Taiwan, perceberemos diferenças acentuadas entre as trajetórias socioeconômicas da ilha e a da China continental.
Taiwan foi incorporada ao império Qing (1644-1912) durante o reinado do imperador Kangxi em 1683. Na época, o imperador se referia à ilha como uma “bola de lama” habitada por povos primitivos, uma região que não valia muito ao império. Nos próximos dois séculos, porém, Taiwan recebeu levas de migrantes das Províncias chinesas de Fujian e Guangdong, aliviando o congestionamento demográfico no sul da China.
A derrota do exército Qing na Guerra Sino-Japonesa de 1894-95 constituiu um divisor de águas na história de Taiwan. A China foi obrigada a entregar a ilha ao Japão, que, durante os próximos 50 anos, se esforçou em transformar os habitantes em súditos de seu império. O japonês se tornou a língua franca nas escolas. Durante as décadas de 30 e 40, jovens taiwaneses participaram das campanhas militares do exército japonês, inclusive do massacre de Nanquim, em 1937. Para abastecer as suas tropas, o Japão estabeleceu indústrias na ilha, mudando a paisagem urbana e econômica.
Com o fim da guerra, Taiwan passou por uma nova transformação. Após os comunistas tomarem o poder, o Exército nacionalista de Chiang Kai-shek se refugiou na ilha. Chiang implementou políticas para inculcar a ideia de que Taiwan era uma Província “chinesa.” O ensino do mandarim se tornou obrigatório nas escolas; os alunos que insistissem em falar qualquer língua local eram punidos. A história da ilha foi novamente reescrita para fazer parte da narrativa da China. Os nomes das ruas foram mudados para evocarem virtudes confucianas, e a propaganda oficial do governo visava despertar um sentimento nacionalista chinês.
Apesar dos esforços de Chiang Kai-shek, os nacionalistas não conseguiram erradicar por completo o profundo legado econômico e cultural do Japão em Taiwan. Ao contrário de outras regiões do leste asiático, a ocupação japonesa é vista de forma mais favorável em Taiwan graças às medidas implementadas por Tóquio para desenvolver a economia da ilha. Hoje a população mais velha ainda fala o japonês fluentemente e muitos _como o ex-presidente de Taiwan Li Teng-hui_ tiveram parentes que morreram lutando pelo Exército japonês na Segunda Guerra Mundial.
A influência japonesa continua presente até mesmo em gerações que nasceram após o final da guerra. Na década de 80, por exemplo, a forma preferida de entretenimento entre jovens monges daoístas era cantar músicas japonesas.
A democratização de Taiwan na década de 90 e o aprofundamento das relações econômicas com a China continental desencadearam um processo que aos poucos está moldando uma nova identidade taiwanesa marcada pela pluralidade, na qual a herança chinesa passou a competir com a cultura local. Políticos começaram a utilizar os dialetos locais para se comunicarem com seus eleitores, os exames para o ingresso no funcionalismo público hoje exigem um conhecimento da história e geografia da ilha, e o governo destina mais recursos para exposições sobre as raízes aborígenes.
Esse redirecionamento da identidade étnica e nacional de Taiwan preocupa o Partido Comunista chinês. Embora hoje a maioria da população taiwanesa ainda prefira a manutenção do status quo à independência, Pequim está ciente de que essa nova identidade poderá atrapalhar as suas relações com Taipé.
…Depois do inferno, vem o paraiso:
Aqui, um Mestrando ganha menos do que o pedreiro que faz bico e um Doutor menos que um porteiro de condominio !
Para não falar da classe política…………
* Thomas Friedman,The New York Times
Frequentemente alguém me pergunta: “Que país você admira, além do seu?” Minha resposta é sempre a mesma: Taiwan. “Taiwan? Por que Taiwan?”, as pessoas perguntam. É muito simples: porque Taiwan é uma rocha nua em um mar repleto de tufões sem recursos naturais que lhe permitam sobreviver – ela precisa importar até areia e cascalho da China para construção –, mas tem a quarta maior reserva financeira do mundo. Porque em vez de escavar a terra e minerar o que quer que encontre em baixo dela, Taiwan cultiva seus 23 milhões de habitantes, seu talento, energia e inteligência – homens e mulheres indistintamente. Sempre digo a meus amigos em Taiwan: “Vocês são as pessoas mais privilegiadas do mundo. Como foi que conseguiram ter tanta sorte? Vocês não têm petróleo, não têm minério de ferro, florestas, diamantes, ouro, apenas alguns pequenos depósitos de carvão e gás natural – e por causa disso desenvolveram hábitos e uma cultura que lhes permitiram aprimorar os talentos do seu povo, e os converteram no recurso mais valioso e mais autenticamente renovável do mundo hoje. Como foi que conseguiram tanta sorte assim?” Pelo menos, era o que eu achava instintivamente. Agora, aí estão as provas.