O mundo mudou entre a China de Mao e a de Hu, e o rei está nu
21/06/12 03:50
Por José Carlos Martins, do Rio de Janeiro
O impasse verificado no desenvolvimento da conferência Rio+20, muito mais do que consolidar as divergências entre países desenvolvidos e menos desenvolvidos sobre as questões ambientais e de desenvolvimento sustentado, expõe com clareza as divergências sobre o modelo de desenvolvimento econômico e social moderno e as possibilidades do nosso planeta em mantê-lo nos primeiros países e estendê-lo aos segundos.
O crescimento demográfico aliado aos fenômenos de urbanização, industrialização e disseminação dos padrões de consumo das nações mais desenvolvidas em direção às nações menos desenvolvidas tem exacerbado o conflito redistributivo em nível mundial. A globalização da economia e a monopolização dos mecanismos de mercado como forma de alocação de recursos e decisão sobre o que produzir e consumir expõe as enormes contradições abrigadas dentro do sistema via os impactos ambientais e o preço das “commodities” agrícolas e minerais, aí incluso o petróleo.
Acredito que a crise do endividamento das pessoas nos Estados Unidos e dos países na Europa seja parte integrante dessas contradições e expõe com bastante nitidez as dificuldades em compatibilizar o enunciado que colocamos em nosso primeiro parágrafo: manter o nível de vida das nações mais ricas e estendê-lo as nações mais pobres. Em outras palavras, tornar as nações mais pobres mais ricas dentro do mesmo padrão de consumo!
Nesse sentido, é bastante sintomático que as mesmas nações que se reúnem para discutir a crise econômica mundial no México dentro do G20 sejam as mesmas que se digladiam na discussão dos temas de sustentabilidade na conferência Rio+20.
Nesse cenário descrito acima, a China personifica aos abastados olhos norte-ocidentais tudo aquilo que deve ser evitado, um crescimento acelerado de uma nação pobre baseado em modelos de consumo ocidentalizados.
Quando Mao Tsé-tung morreu, em 1976, a China era um país rural de 1 bilhão de habitantes, pobre, quase paupérrimo, com 85% de sua população vivendo no campo numa economia de subsistência, com uma parca dieta vegetal, sem meios de transporte além de pernas, bicicletas e de seus animais.
A maior fonte de energia disponível era primária, tirada deles próprios ou da natureza sem nenhuma sofisticação industrial. A infraestrutura de energia e transporte era quase inexistente para o tamanho de sua população, e os padrões de consumo, tão frugais que seria impossível a um ocidental imaginar como eles podiam viver daquela maneira. O sonho de consumo de um chinês era um rádio e uma bicicleta, e a moda, ano após ano, eram os indefectíveis terninhos tipo Mao, com o mesmo design e cores, distribuídas duas ou três peças por habitante. Tudo era racionado, da comida ao sabonete. Os níveis de consumo da China, principalmente de alimentos, beiravam o limite da sobrevivência, daí a grande criatividade dos chineses nos ingredientes de sua culinária, principalmente no que tange a proteína animal.
O impacto da China no mercado mundial de commodities agrícolas, minerais e energia era zero, assim como seu impacto no mercado de bens industrializados. Embora já dispusesse de um razoável poderio militar e inclusive detentora de bombas nucleares, do ponto de vista do impacto econômico no mundo e pressão sobre recursos naturais e emissão de poluentes, tudo se passava como se a China e suas centenas de milhões de habitantes não existissem! Era um enorme ponto no mapa mundial despertando mais curiosidade do que qualquer preocupação. A China de Mao, em 1976, não era muito diferente da China vista por Marco Polo ao final do século 13 ou por Lorde MacCartney ao final do século 18. A China era um imenso país igualitário, vivendo na pobreza absoluta.
Em 2012, apenas 36 anos depois, a China de Hu Jintao, em termos mundiais, é a segunda maior economia, a primeira nação industrial e maior exportador de bens industriais. O país é hoje o maior produtor e consumidor mundial de aço, alumínio, cimento, automóveis, eletrodomésticos, computadores, roupas, sapatos, para nomear alguns itens. Maior consumidor mundial de alimentos, energia e commodities minerais. Nesse curto espaço de tempo, a China deixou de ser uma bucólica nação agrícola e rural para se tornar uma nação industrializada, quase urbana com mais de 50% de sua população vivendo nas cidades.
De uma modorrenta economia de subsistência, se transformou numa pujante economia de mercado. Uma nação praticamente sem infraestrutura se transformou no maior produtor mundial de energia, com uma extensa rede de estradas de rodagens, ferrovias, dezenas de portos e aeroporto, uma infraestrutura de colocar inveja em qualquer nação do primeiro mundo! Suas imensas cidades costeiras contadas às dezenas rivalizam com as mais modernas cidades do Ocidente em termos de padrão arquitetônico e modernidade.
Como decorrência da generalização dos padrões de consumo ocidentais, a China é hoje uma das nações que mais polui e que mais emite carbono na atmosfera terrestre. A China é também a nação que mais investe em energia renovável e uma nação que neste momento de grandes questionamentos a nível mundial realiza façanhas espaciais dignas dos Estados Unidos e União Soviética de outros tempos. Do ponto de vista social e econômico, a China de Hu Jintao é tudo que a China de Mao não era!
Com mais de 1,3 bilhão de habitantes e todo esse crescimento alicerçado no modelo econômico, social e hábitos de consumo ocidentais, a China é a demonstração prática da imensa contradição que se abriga no nosso sistema de vida. Os padrões ocidentais de desenvolvimento econômico e social não são compatíveis com sua universalização no nível atual de avanço tecnológico. O exemplo chinês, que ainda não atingiu nem de longe os padrões de vida e de consumo das nações ocidentais, é uma clara demonstração disso.
Nossa civilização ocidental desenvolveu um modelo econômico baseado na abundância relativa, isto é, os recursos do mundo são para todos e devem ser comercializados livremente pelas forças de mercado, mas os padrões de vida e consumo, não. Assim caberá a algumas nações e povos trabalharem mais e fornecerem os recursos. E a outras consumirem. Umas viverão na abundância e outras na penúria! Parafraseando Clausewitz, que dizia que “a guerra é continuação da política sob outros meios”, atrevo a dizer que “a globalização dentro da visão ocidental é a continuação do colonialismo e da escravidão sob outras formas”.
Depois de séculos de exploração colonial, a pregação pela abertura comercial e dos benefícios da economia de mercado, propagados à exaustão pelas nações abastadas do centro como modelo a ser seguido pelas nações pobres da periferia, parece não estar resistindo a seu grande teste que é o crescimento chinês. Imaginem se os demais 4,7 bilhões da população mundial seguirem o mesmo caminho da China! O crescimento acelerado da China era tudo que as nações ocidentais não sabiam que não queriam!
Um dos grandes méritos do crescimento chinês foi desmascarar o rei. Ele está nu como nunca esteve. A China fez isso usando os mesmos mecanismos de mercado e de acumulação usados pelas nações ocidentais que cresceram e elevaram seu padrão de vida por séculos, baseado no interesse nacional de cada país, de forma consciente ou inconsciente ou simplesmente pela ordem orgânica da reprodução capitalista. A China demonstra cabalmente a contradição fundamental do sistema capitalista e da nossa forma de vida, uma grande e apetitosa cenoura que nem todos podem comer, mas que continua nos levando na mesma direção.
O que vemos na Rio+20 e no G20 é verso e reverso da mesma moeda. O crescimento chinês está ocupando um espaço que era ocupado pelas nações desenvolvidas na expansão de seu bem-estar social. O crescimento da China alterou definitivamente o padrão das trocas internacionais, a grande fonte de crescimento da produtividade das nações industrializadas juntamente com o domínio da inovação tecnológica. Como forças políticas dominantes nessas nações ditas democráticas estão sujeitas ao sufrágio para se manter no poder, era natural a pressão para manutenção do status quo. Na falta de ganho nas trocas internacionais e nos avanços tecnológicos que permitissem o crescimento da produtividade e por consequência a evolução sustentada dos padrões de vida e de consumo, as nações e pessoas do ocidente usaram o mecanismo de que dispunham para manter ou mesmo elevar esse padrão, ou seja, o crédito.
Nos últimos dez anos que antecederam a crise de endividamento de 2008, as nações ocidentais progrediram e ampliaram seu padrão de vida e de consumo não somente com base em ganhos nas trocas internacionais e avanços tecnológicos, como vinha sendo o padrão desde o início da Revolução Industrial. A melhoria de vida e aumento do consumo foi baseada em grande parte no crédito fácil, até que fosse atingido o limite do endividamento.
Para essa festa creditícia que hipertrofiou o sistema financeiro alavancando perigosamente o PIB mundial, ajudou o forte crescimento da liquidez internacional e o apetite e a criatividade dos bancos para correrem riscos inaceitáveis e realocar essa enorme liquidez decorrente criação da União Europeia e da incorporação dos países comunistas de economias centralizadas à economia de mercado. Antiga União Soviética, os países do Leste Europeu, inclusive a Alemanha Oriental, e principalmente a China foram incorporados na economia de mercado e na economia ocidental provocando forte crescimento de produtividade e da liquidez em nível mundial, permitindo essa festa de endividamento proporcionada pela extrema criatividade e apetite por riscos do sistema financeiro internacional.
Forçosamente temos de mencionar a política de desregulamentação criminosa e relaxamento dos controles financeiros proporcionados pelas autoridades econômicas dos países ocidentais, quase sempre decorrentes do interesse político de se manter no poder proporcionando aos seus eleitores uma falsa impressão de abundância e desenvolvimento por meio do crédito farto e barato. Os Estados Unidos da América têm posição central nesse fenômeno monetário!
Um bom exemplo desse período é um discurso que vi um dia desses na televisão do então presidente George Bush falando antes da crise das hipotecas nos Estados Unidos, enaltecendo as virtudes da desregulamentação e o acesso a crédito, que permitia a um garçom (bartender, na sua expressão) comprar uma bela casa financiada a perder de vista e depois levantar mais crédito em cima da mesma casa para comprar outras coisas.
O crédito tem na economia o mesmo efeito da droga, pois permite consumir sem o ônus momentâneo da produção. O prazer que o consumo nos dá é equivalente às penas pelo qual passamos para poder pagar por ele. Abdicamos do ócio, abdicamos do lazer, do tempo com nossos familiares para trabalhar e poder consumir depois! Com o crédito, num primeiro momento só temos o prazer do consumo e postergamos as penas para depois. Como dizia um ex-patrão que tive, o problema de dinheiro emprestado é que depois temos de devolver, com juros e correção!
A economia mundial, principalmente a economia ocidental, se viciou em crédito e agora viver sem isso é muito difícil, tão difícil quanto é difícil ao ser humano abandonar seus vícios, como o álcool, o fumo ou drogas! Para pagar a dívida acumulada consumindo no passado, teremos de trabalhar mais e consumir menos no futuro!
Para as nações ocidentais, chegou a hora de pagar a conta. Como num belo jantar no melhor restaurante da cidade, estão todos sentados à mesa, sem dinheiro no bolso, talão de cheque ou cartão de crédito, super empanturrados de comida e bebida. E quando o garçom apresenta a conta, ninguém olha para ele esperando que alguém mais corajoso se atreva a perguntar quanto é ou proponha um empréstimo salvador de última hora.
E neste momento ainda aparecem alguns “penetras” querendo comer na mesma mesa, viver na mesma fartura e ainda pedindo para algum troco para a condução ou para a gasolina!
Ao pousar meu olhar sobre esses acontecimentos bastante atuais e usando uma perspectiva histórica, peço licença a Karl Marx para citar duas de suas frases mais significativas, entre muitas, para tentar aproximar do cerne da questão, como eu a vejo: “Todo sistema traz em si os germes de sua destruição” e “a história se repete uma vez como tragédia, a outra como farsa”.
Com relação à primeira frase, acredito que há certa concordância entre países ricos e pobres de que é impossível estender os padrões de consumo existentes nas nações mais desenvolvidas compreendendo cerca de 1 bilhão de pessoas para todas as nações do mundo que totalizam hoje 7 bilhões de pessoas! A menos que algum avanço tecnológico quântico consiga transformar escassez em abundância, essa equação não fecha! Vai precisar tempo, muito tempo para que isso venha a ser possível, mas, como o exemplo da China demonstra, as nações menos desenvolvidas têm muita pressa e as desenvolvidas, nenhuma!
Marx acreditava que, assim como a expansão do comércio e a acumulação do capital em mãos dos capitalistas destruíram o feudalismo, o surgimento da classe trabalhadora e a luta de classes destruiriam o capitalismo. Ele acertou o diagnóstico fatal, mas não diagnosticou o germe, o vírus, a doença!
A disseminação do modelo de consumo ocidental, a escassez de recursos naturais e a degradação ambiental é o germe que corrói nosso sistema. Tanto a questão da disponibilidade de recursos naturais para sustentar os níveis atuais de consumo das nações mais desenvolvidas como os impactos ambientais da exploração desenfreada desses recursos permanecem como termos sem solução nessa equação. E embora haja acordo sobre a necessidade de equalização sob o princípio da solidariedade e da justiça universal e sobre a necessidade de preservar o meio ambiente não só para nós como também para as futuras gerações, há pouco entendimento sobre quem irá pagar o custo da equalização e da preservação.
Somente um revolucionário avanço tecnológico poderá modificar essa equação. Mas a parcimônia com que os países mais desenvolvidos transferem sua tecnologia demonstra que mesmo que esse salto tecnológico deverá ser utilizado em benefício exclusivo de quem o desenvolveu. Uma segunda alternativa é a paralisação desse processo virtuoso de redistribuição da riqueza e de expansão do bem-estar social em nível mundial ou então uma terceira via, onde os padrões de consumo e nosso modo de vida são modificados radicalmente para conciliar nossas necessidades com a disponibilidade de recursos e a capacidade do ecossistema da Terra suportar a presença humana.Acredito numa solução composta dessas três vertentes, mas isso se dará numa perspectiva de longo prazo, após muitas marchas e contramarchas. Vai ficar quem sabe, com certo otimismo, para a Rio+40
Dois pontos de divergência nas discussões da Rio+20 demonstram muito bem isso. Vão os países ricos e mais desenvolvidos pagar a conta da proteção ambiental? Estarão os países desenvolvidos dispostos a transferir gratuitamente aos países menos desenvolvidos as tecnologias necessárias para a proteção ambiental? A resposta, como vimos, foi um sonoro não!
Dentro do G20, as discussões sobre como pagar a conta do endividamento das nações europeias não evoluem. Não se encontra ninguém disposto a enfrentá-la, seja pela redução do padrão de vida e consumo e aumento da poupança, seja pelo refinanciamento dessas dívidas. A resistência obstinada da Alemanha, uma das nações mais beneficiadas pela integração europeia e pela desintegração da União Soviética e do Leste Europeu, é um exemplo muito claro da falta de solidariedade nessas horas.
Com relação à segunda frase, “a história se repete uma vez como tragédia, a outra como farsa”, toda vez que o mundo enfrentou dilema semelhante no passado, do limiar das guerras napoleônicas à antessala das duas grandes guerras mundiais (na realidade a segunda foi apenas a continuação da primeira) a história se fez como tragédia, custando sofrimento, destruição e milhões de mortes.
Embora ainda não tenhamos um desfecho da crise atual, numa visão particular do que vejo no Rio+20 e nas reuniões do G20 me permitem afirmar que, como agora somos mais civilizados (eu espero), a história desta vez se repetirá como uma farsa, eivada da hipocrisia norte-ocidental. A grande vantagem será desmascarar a farsa sobre a universalidade do sistema de vida ocidental e sobre a amizade e a solidariedade entre as nações. Amizade pode existir entre as pessoas e até entre os povos, mas, entre as nações, o que existe são apenas interesses. E é muito interessante observar que as nações mais resistentes nesse processo são as grandes democracias ocidentais cujos eleitores de forma direta ou indireta sustentam a posição tão retrógrada desses governos em termos de justiça universal e proteção ambiental.
Mais do que nunca, nesses dois encontros, o que mais se discute são os interesses nacionais em detrimento dos interesses da humanidade. Embora haja pouca esperança sobre a mudança da natureza humana, da lógica das nações e dos interesses nacionais, espero estar certo no meu diagnóstico sobre a farsa, pois numa farsa pelo menos podemos rir das nossas próprias desgraças!
你的文章是非常現實的 !
Só ficaria feliz se usasse menos exclamações
Caro Marcelo, agora está claro para mim o ponto que você queria levantar.Um diálogo funciona melhor do que um monólogo, já que a verdade não é algo absoluto e depende da percepção humana, do pensamento, para emergir. Não pretendo discutir sua visão mesmo porque não sou sou avesso a ela. Apenas reafirmo que tenho dificuldade em reconhecer estar participando de uma farsa. Acredito estar participando de algo útil para os brasileiros e para o meu país uma vez que o homem cidadão do mundo é uma obra da ficção marxista, infelizmente. Se a minha participação se dá dentro de uma ótica capitalista ou qualquer outra é indiferente, pois não modifica a natureza essencial das coisas. A exploração do homem pelo próprio homem é intrínseca à natureza humana, como todas as experiências de fazê-lo diferente demostraram. Se essa exploração se dá via capitalista ou via Estados Nacionais é apenas um detalhe a mais. Se esse é o caso, cada um de nós, conscientes de que participamos de uma farsa da humanidade, deve dar o melhor de si para que ao menos ela não se transforme em tragédia. Como o resultado final é o mesmo e a cada ciclo da humanidade a história a se repete, melhor que se repita como farsa e não como tragédia. Assim podemos continuar desfrutando daquilo que realmente interessa, que é o sorriso dos nossos filhos, o afago das nossas esposas, o abraço dos amigos, aquelas pequenas coisas da vida que realmente valem a pena viver. No restante, devemos fazer o melhor, evitar prejudicar os outros e estar em paz com sua própria consciência, mas nem por instante sequer, aceitar a alienação como estado de espírito mesmo que isso possa parecer aos olhos de alguns, uma farsa. Mesmo na farsa, nem todos são palhaços! Muito grato pela sua participação neste diálogo, pois nossas diferenças estão em nuances, muito mais do que no conteúdo.
Ok, belo texto, não nego. Posso dizer que é demonstrativo de lucidez e esclarecimento.
Entretanto, vejo que é diretor de Estratégia da Vale. Assim sendo, ou não é muito ouvido nos círculos internos ou este texto não passa de ilustração pedagógica do conceito de farsa a que alude. Neste sentido seria brilhante: a denúncia da farsa servindo à farsa.
Marcelo, o CNPJ está no meu curriculum mas também tenho CPF! O fato de ser diretor da Vale me deu o previlégio de conhecer a China e muitos outros países do mundo e me permitiu compreender os fenômenos da atualidade de uma posição inigualável. Sou imensamente grato a essa circunstancia da minha vida e quero compartilhar com todos vocês o que aprendi com essa oportunidade única que a Vale e o meu país me proporcionaram. Não faço nada no meu trabalho que esteja em desacordo com minha consciência. Se você está se referindo a questão ambiental, eu lembro que a atividade humana tem duas dimensões, a produção e o consumo. Ambas têm responsabilidades equivalentes. Se não houver demanda, não haverá produção, mas, como o exemplo que relatei mostra, ninguém está disposto a abrir mão do conforto da vida moderna. Minha função neste blog não é defender ou fazer propaganda da Vale, o que tenho evitado. Reconheço que a imagem da indústria de mineração não é das melhores e temos trabalhado muito para melhorá-lá com práticas produtivas cada vez menos impactantes. Mas cabe à sociedade decidir seu modelo de vida e se você olhar a sua volta verá que não podemos viver sem o aço e, para produzí-lo, é necessário o minério de ferro, que tem de ser extraído da natureza. A própria existência do homem afeta o meio ambiente e apenas uma cidade como São Paulo impacta uma area muito maior que a area impactada por todas nossas minas, gerando muito mas resíduos e emissões. A agricultura e a pecuária que produzem nosso sustento impactam milhares de vezes mais como a própria discussão do código florestal demonstra, mas podemos viver sem o seu produto? A necessidade de alimentar o mundo irá impactar o meio ambiente muito mais do que a atividade de mineração, posso lhe assegurar. A equação ambiental tem dois lados, e o que procurei demonstrar é que a questão fundamental reside muito mas no consumo do que na produção. Agradeço sua colocação e a oportunidade que você me deu para abordar esse ponto.
Enquanto encarnava o seu CPF, argumentou de forma brilhante; na defesa (velada) do CNPJ, acho que foi um pouco sofismático.
São Paulo é um organismo vivo, constituído de múltiplos agentes com interesses conflitantes, vários beneficiários e vários prejudicados por cada um dos aspectos de sua constituição. Não há uma fronteira clara para a definição do que é uma cidade. Mesmo que não tivessemos a classe política desprezível que temos, ainda assim, os grandes centros brasileiros seriam, como todo grande centro, entes fora de controle, frutos de uma dinâmica muito mais abrangente do que seus próprios movimentos internos.
As atividades agropecuária e mineradora, em suas manifestações globais, são frutos de processos como os que descreveu, se manifestando, entretanto, através de modelos diversos: uns mais predatórios, outros menos; uns mais concentradores de benefícios, outros menos. A necessidade de seus resultados não justificam todas as formas disponíveis de sua implantação.
Entenda, estou longe de ser um ambientalista de carteirinha e, entre os males de determinados modelos de exploração, o maior que vejo tem caráter social.
A Vale não é a exploração mineral; é tão somente um agente que se beneficia desta através de um modelo que pode ser contestado, independentemente da necessidade dos “fins declarados” de sua atividade. É, adicionalmente, um agente controlável, reflexo da conciliação das vontades de seus dirigentes e dos entes políticos que sobre ela exercem influência.
“Nossa civilização ocidental desenvolveu um modelo econômico baseado na abundância relativa, isto é, os recursos do mundo são para todos e devem ser comercializados livremente pelas forças de mercado, mas os padrões de vida e consumo, não.”
O único retorno que Corumbá (conhece, não?) desfruta do minério extraído de seu solo é a cor de suas estradas, transformando a “cidade branca” em vermelha, como pau-brasil. Região estratégica para o Brasil… por ser fronteira ou por fornecer ferro? Por ser habitada por brasileiros é a última coisa que se pensaria, não é mesmo.
Os hábitos de consumo vistos como germes do processo predatório, no sentido de redimir as forças produtivas, também não me convence. Produção e consumo integram uma relação de mão dupla; a produção e a evolução dos seus meios influenciam os padrões de consumo. O amplo mercado consumidor disponível aos ingleses determinou os rumos da revolução industrial não por conta dos hábitos de consumo dos povos sob sua esfera de influência ou dominação, mas simplesmente pelo fato de que o acesso a produtos, quaisquer que sejam, que apresentem um acréscimo na utilidade, se torna desejável por qualquer grupo humano. Obviamente, chegamos a um ponto em que o discernimento quanto à utilidade é que parece constituir o cerne do problema. O próprio ato de consumo virou o produto, cuja utilidade única é o efeito momentâneo sobre o ânimo psíquico. O que é, entretanto, processo subconsciente para os consumidores, toma forma de elaboração intencional entre produtores.
Finalmente, mesmo que reconhecida a contribuição de ambos os pólos, assim como o desinteresse político de um povo não perdoa a corrupção de seus eleitos, os hábitos de cosumo não redimem os processos produtivos deturpados que neles tentam se justificar.
O aço, como diz, é fundamental no contexto atual, como era o carvão durante a revolução industrial. A “Doença Negra” dos mineiros, submetidos a condições sub-humanas, não perde impacto diante do reconhecimento da utilidade do carvão. Ela existia, não em função da necessidade de energia, mas em função das relações de poder existentes à época. Não fosse isso, outro modelo de exploração seria encontrado. As relações de poder ainda definem o modo como exploramos nossas riquezas e, no nosso país, ainda não nos livramos das pequenas elites que as tomam para si… dos donos do poder.
Não me leve a mal, não procuro um embate. O seu texto é muito bom e concordo plenamente com grande parte de sua análise. Acredito, no entanto, que se concilia com a forma de ação da empresa em que atua unicamente como farsa.
Muito bom artigo. Entretanto, cabe ressaltar que por mais de 2.000 anos a China foi um país lider mundial. Na época do imperio romano, a china era seu equivalente no oriente.
Perdeu sua importancia com a dinastia manchu, quando o ocidente se aproveitou do poder da mão de obra chinesa. Mao preparou a China para sua independencia, para poder se usar do capitalismo para dar o salto atual. A China foi dominada pelo ocidente por 100 anos (apos a ignobil gerra do ópio) e recuperou sua autonomia com Mao e a expulsão do ocidente de seu solo. O povo é disciplinado e preza o conhecimento ,a leitura, e portanto o avanço tenologico.
Caro Dinarte, concordo plenamente com você, conforme já expus em outros artigos. Até o século 18, com a decadência da dinastia Qing, a Revolução Industrial e a chegada dos ingleses, a China era a maior economia do mundo e, até o século 16, liderou o mundo em termos de conhecimento científico e realizações humanas. Mao recebeu do povo chinês um mandato para livrá-lá da ocupação colonialista e o fez com maestria e dedicação. A evolução tecnológica da China confirma suas palavras. Estamos de pleno acordo!
Sr. J.C. Martins, uma Boa Tarde.
Sua visão sobre o progresso econômico da atualidade chinesa é perfeita. É um fenômeno no limiar do séculoXXI. Só lamento que não disse uma palavra sequer sobre a questão política, inexistência da democracia e maltrato aos estudantes e ao povo em geral. Se a Comunidade Mundial silenciar a respeito … será lamentável e a Humanidade sofrerá muito … Até outro dia, s.y. http://yamaguchishigeru.blogspot.com/
Sr Shigeru Yamaguchi: seus comentarios representa o que a midia ocidental sempre martelou, sempre na mesma tecla (a torcida contra eh grande);
Muitos ou quase todos dos teus comentarios ja nao mais existem, ha muito tempo!
O povo de la nao sofrem como nos daqui ! nao se compra ! eles estao muito melhor em todos os quisitos.
Ah, outra coisa, o povo da china nao compartilha com teus pensamentos, alias, muito pelo contrario !
Yamaguchi-san, visitei seu blog e concordo com sua visão dos problemas brasileiros! Com relação à questão da democracia na China, sabemos que o sistema político lá não tem nada a ver com o modelo ocidental. A exemplo de muitos outros países asiáticos de tradição confucionista e passado imperial, a democracia tal qual nós conhecemos sempre passou longe da China. Se essa for a vontade do povo chinês, acredito que será impossível evitá-lá. O progresso material dos povos sempre os empurra para um sistema democrático representativo. A democracia quase sempre é conquistada, pelo progresso, pela revolução ou pela guerra, como a história nos mostra. O exemplo japonês, que o senhor deve conhecer bem, demonstra isso com clareza. Até o século 19, o Japão imperial passava muito distante de uma democracia. Mudou muito sua cultura, seus costumes para poder se inserir no comércio internacional. No início do século, o imperador cedeu seu poder aos militaristas e só abraçou a democracia ocidental depois de uma guerra sangrenta, duas bombas atômicas e a ocupação americana. Nem por isso os japoneses se rebelaram contra o imperador e até hoje o respeitam e o reverenciam. A cultura confucionista é antidemocrática na sua essência, e esses povos sempre viveram sob regimes autoritários. Mas o senhor tem razão quanto às mazelas do sistema chinês, mas caberá aos chineses decidir o que querem para si.
Sr. Yamaguchi,
Como classificar os direitos humanos adotados pelo Japão para com o restante da Ásia entre o final do século XIX e a o final da Segunda Guerra Mundial? Seria pior ou ainda assim, melhor do que esse sistema chinês que o senhor critica?
Já que lembro do “glorioso” papel desempenhado pelo Japão na II Guerra, o senhor confirmaria a informação de que o Almirante Yamamoto é admirado de PAIXÃO, além de respeitado na China, por exemplo?
Quanto a política japonesa, me parece que a maior “genialidade” do país no pós-II Guerra foi ter se permitido virar cortesã dos americanos. De quebra, com isso pôde se gabar de “incorporar” os valores dos seus donos, de modo que agora se arrostam de serem iguais.
Doce ilusão…
Impresionante! Parabéns, O senhor Martins.
Congratulation, an astonishing and impressive text indeed.
Parabéns, José Carlos Martins, pela lucidez e pelo brilhantismo de sua análise da conjuntura mundial. Apenas um pequeno reparo: ao tempo de Marco Polo, a China era a maior economia da Terra e o país mais rico (como, aliás, teria declarado o próprio Marco Polo, impressionado com o que viu), e também o mais avançado tecnologicamente.
É verdade, Tomaz! Aos olhos de Marco Polo, a China era mais evoluída que a Europa.A decadência chinesa começou na dinastia Qing, no século 16. Quando o Lorde Macartney chegou, ela ainda era grande, mas estava na descendência. Com um pouco de ópio, os ingleses a fizeram dormir. Mas, em termos comparativos, a China que Marco Polo viu não era muito diferente da China de Mao. Em termos relativos, a Itália de Marco Polo, antes da Renacença, era mais atrasada que a China. Tem gente que acredita que o conhecimento que veio da China ajudou o Renascimento na Itália. Mas isso é história para outro artigo!
Excelente texto. Parabéns, sr. José Carlos. Não ficou preso somente à CHina como geralemente fazem quando o assunto é CHina. É um texto sobre história mundial contemporánea. É o tipo de texto que gostaria que todos pudessem entender…
Parabéns, sr. José Carlos Martins, dentre bons texto este foi o seu melhor. Conseguiu falar da China traçando conexões com a História mundial. O mais importante é que não ficou preso à China, como é de praxe em textos sobre o império do meio. Fantástico.
me esqueci muito util os teus comentários, Tua visão global dos fatos são reais, meus parabens.
A egemonia do norte frente ao sul, sempre foi uma farsa. o interesse deles em relação a nos sempre foi o de nos manter escravos e fornecedores de materias primas necessárias ao seus parque industriais. Só sei que o final será muito tragico, acredito que na atual velocidade não alcançaremos 2040 como sitou. Vai faltar insumos para a continuidade ai sim o mais forte subjugara o mais fraco.